segunda-feira, 26 de novembro de 2007

As coisas que nunca me disseram

Tive uma infância muito feliz, povoada pelos inúmeros e imensos sonhos que a minha avó me ajudava a construir. Tive neste mundo, um universo só meu, onde a fantasia e a imaginação me levavam para além, muito para além; e foi através dessa incomensurável idealidade que me construí como gente e fiz daquilo que me rodeava, uma ilusão.
Lá, nesse limbo por onde andava, não existiam pessoas más, apenas bruxas que acabavam por explodir. Não existia nem tristeza, nem inveja, nem ódio, nem morte, tudo era pintado com todas as cores do arco-íris e profundamente perfumado pelo odor das flores. E creio que para todas as crianças, pelo menos nessa época, o seu universo seria assim.
Mas nunca ninguém me disse que eu iria crescer e que todos os pais e todas as mães que eu conhecia e que ao passarem por mim, me deixavam uma carícia, que eles, todos eles, escondiam por detrás da máscara de um sorriso, a capacidade de sentirem ódio e raiva e muita maldade.
E também não me disseram que os meninos da minha idade, poderiam um dia, tornar-se em filhos maus, abandonarem os pais e as mães ou maltratá-los.Que os carrinhos com que eles brincavam, se iriam transformar em tanques de guerras, e seriam capazes até de matar.
Que também eles um dia, gerariam filhos e que iriam ajudar a tornar ainda maior essa espiral de maldade.
Tão pouco me falaram da morte. Da dor que sempre aumenta com a ausência de alguém que partiu.
E dentro do meu peito, onde antes batia um coração sonhador, instalava-se agora o medo, não o medo da maldade em si, mas de me poder tornar como eles, num ser intolerante, egoísta, soberbo e tendenciosamente perverso, porque nunca ninguém me disse que um dia, eu iria crescer e ter que conviver com os outros nesse mundo que apesar de colorido, não era pintado a cores vivas mas com as cores cada vez mais mortiças do amor, da compaixão e da ternura.

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