quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

O casulo da alma

Se para muitos, é causa de sofrimento, para outros, mais do que uma forma de estar, a solidão é, não só uma necessidade, mas sobretudo, um estado de ser
O mundo está repleto de pessoas que sofrem com a solidão a que esta vida, tão cheia de liberdade, independência e do nosso próprio egoísmo, as votou, sem apelo nem agravo. Mas, se por um lado pode ser terrível, por outro, ela pode ser por vezes, a melhor companhia, uma espécie de retirada estratégica, o refúgio possível perante a nossa incapacidade de lidar contra a dura realidade da vida, ou tão-somente, o lugar onde vamos beber muita da nossa inspiração criativa.
Gosto da solidão e da oportunidade que me proporciona de estar a sós comigo, permitindo-me o encontro com aquele pedacinho de paz que existe bem fundo, dentro de todos nós. Adoro o estado introspectivo que me ajuda a perceber-me a mim mesma e ao mundo que me rodeia, com o tal certo olhar.
Para mim, ela é uma espécie de luz que se alimenta a si própria, fora do mundo e no entanto centro do mundo, um deixar-me envolver pelo casulo da minha alma, e lá ser livre, mas principalmente, encontrar o equilíbrio para depois regressar ao convívio com os outros, mais forte e quiçá, mais sábia.
É complicado pôr em palavras, este estado de ser e de estar, intrínseco e inato na alma de um artista, sobretudo, quando a nossa profissão significa a exposição do nosso mundo interior perante essa massa anónima a que chamamos de público, mas a verdade, é que durante as nossas actuações, algo de nós não está lá, mas sim, nessa solidão, nesse desligamento, onde nos esquecemos do mundo e de nós próprios.
Talvez por isso, por vivermos muitas vidas dentro de um só corpo, por termos de ser capazes de transmitir e proporcionar aos demais, um pouco da magia e do sonho, as pessoas confundam extravagância com intensidade, exuberância com talento, loucura, com a capacidade de estarmos sós, dando-nos aos outros.
Todo o processo criativo seja ele qual for, é doloroso. A obra é gerada e concebida no mais íntimo do nosso ser, nessa espécie de transe que a solidão nos provoca, depois, e ainda mais difícil é conseguirmos trazer à luz, mas sobretudo ao entendimento e ao conhecimento dos outros, esse nosso mundo secreto e inacessível.
Por mais incrível que possa parecer, não somos nós que escolhemos ser assim, nasce-se assim. Fadado para a solidão, porém, incapazes de a conter dentro de nós. Talvez por isso, dizia Alberto Caeiro : -“ Não tenho ambições nem desejos, ser artista não é ambição minha, é a minha maneira de estar sozinhO

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