Cabeça pequenina enfeitada por um carrapito branco. Corpo volumoso. Braços curtos, mãos sapudas, o rosto de expressão sempre triste, era assim a prima Ângela o alvo favorito da nossa chacota.
Não foram muitas, as vezes que estive com ela, mas hoje, enquanto que o meu conhecimento sobre o mundo e sobre as pessoas, se aprofunda, consigo compreender, a razão da sua mania.
É que a prima Ângela, tinha por inseparável companhia, firmemente seguro pelas mãos papudas e poisado delicadamente no regaço, o seu tesouro, e onde quer que fosse, onde quer que estivesse, ali estava a mala, uma velha e gasta mala que talvez outrora, tivesse sido de cor preta e que ela mantinha bem juntinho de si e manteria até ao fim dos seus dias, intocável.
Quando por fim partiu, a curiosidade de todos era imensa, afinal que segredos conteria aquela velha relíquia! Apenas e somente velhos retratos, pequenas fitinhas de tecido, alguns anéis de cabelo. Era este o seu valioso tesouro, as únicas reminiscências de um filho precocemente falecido.
Ao recordar esta história, não posso deixar de pensar que todos nós, também mantemos, ciosamente guardados, preciosos tesouros, uns dentro do peito, outros cravados na nossa alma e que nos mantêm presente, o caminho percorrido, mas no caso da prima Ângela, não era de todo essa perspectiva que ela buscava, para ela, aqueles pedacinhos do passado, mantinham-na, tal como uma âncora, presa à saudade.
sábado, 5 de janeiro de 2008
Intocável
Hoje mais do que noutros dias, dei comigo a olhar, fixa e pensativamente, para a imagem que reflectia no espelho.
Não sei muito bem quando os meus cabelos começaram a branquear, nem tão pouco me lembro, quando a primeira ruga em volta dos olhos se instalou, contudo, os anos passaram e deixaram ficar a sua marca no meu corpo, tornando-o numa espécie de paisagem desenhada por inúmeras linhas, porém só eu sei, que por detrás de cada uma, existiu uma linda história que por vezes me fez sofrer, mas que me proporcionou uma aprendizagem valiosa, por isso confesso, a maduridade trouxe consigo, serenidade, mas sobretudo, beleza interior e sabedoria. Apagá-las seria o mesmo que apagar a minha própria narrativa ou, para mim mais grave ainda, desprestigiaria seguramente, todo o meu crescimento interior.
Sim, orgulhosamente, tenho “rugas”, no rosto e na alma, rugas essas, que cuidadosamente tento tornar menos profundas, trazendo até a mim, a ternura que sempre perfumou o meu caminho. Mas de todas, as mais queridas e mais belas, são e serão sempre, aquelas marcas de expressão que adquiri, quando sorri enquanto o meu coração chorava, e são precisamente essas, que pretendo manter, intocáveis.
Não sei muito bem quando os meus cabelos começaram a branquear, nem tão pouco me lembro, quando a primeira ruga em volta dos olhos se instalou, contudo, os anos passaram e deixaram ficar a sua marca no meu corpo, tornando-o numa espécie de paisagem desenhada por inúmeras linhas, porém só eu sei, que por detrás de cada uma, existiu uma linda história que por vezes me fez sofrer, mas que me proporcionou uma aprendizagem valiosa, por isso confesso, a maduridade trouxe consigo, serenidade, mas sobretudo, beleza interior e sabedoria. Apagá-las seria o mesmo que apagar a minha própria narrativa ou, para mim mais grave ainda, desprestigiaria seguramente, todo o meu crescimento interior.
Sim, orgulhosamente, tenho “rugas”, no rosto e na alma, rugas essas, que cuidadosamente tento tornar menos profundas, trazendo até a mim, a ternura que sempre perfumou o meu caminho. Mas de todas, as mais queridas e mais belas, são e serão sempre, aquelas marcas de expressão que adquiri, quando sorri enquanto o meu coração chorava, e são precisamente essas, que pretendo manter, intocáveis.
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